Um dito ou frase que se repete exaustivamente em um povoado, localidade ou num município qualquer, se transforma em um “chavão”, e quando pensamos em escola e na sociedade com suas mazelas ou virtudes, temos que reconhecer a veracidade da afirmativa de que “a escola reproduz a sociedade a qual serve”.
Com a intencionalidade de fazer uma reflexão sobre a violência que está dentro da escola, mas sem tirar o olhar do que acontece na sociedade como um todo, analisemos os riscos e perigos a que estão expostos os estudantes.
Quando no seu artigo 5º, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, afirma que: Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. Caracteriza de forma muito clara a necessidade de proteção, amparo e acompanhamento a que tanto a criança quanto o o adolescente requerem nessa fase do seu desenvolvimento.
E no ambiente escolar esses cuidados devem ser uma rotina daqueles responsáveis pela criação de um espaço estruturado e devidamente organizado para a prática pedagógica consequente, mas na nossa realidade diária, será que encontramos esse nível de compromisso? A resposta que nos vem à mente com certeza é negativa, a começar pelo grau de comprometimento dos gestores municipais, estaduais ou federal com a educação, exemplificados em Pernambuco pelo investimento irrisório feito mensalmente por aluno da educação básica de 04 a 17 anos de apenas R$ 179,75, pela taxa de abandono nos ensinos fundamental e médio em 2010 de 21% e de reprovação no mesmo ano nos ensinos fundamental e médio de 32,5% e um percentual de apenas de 40,8% de conclusão de jovens de 19 anos no ensino médio, nos dá também a dimensão de outra violência: a que não cria oportunidades concretas para todos. Como conceituada por Azevedo e Guerra no Guia Escolar da Secretaria Especial dos Direitos Humanos do Ministério da Educação quando diz que violência é: “todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra criança e ou adolescente que, sendo capaz de causar à vítima dor ou dano de natureza física, sexual e/ou psicológica, implica, de um lado, uma transgressão do poder/dever de proteção do adulto. De outro, leva a coisificação da infância, isto é, a uma negação do direito que crianças e adolescentes têm de serem tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento”.
Aliado a esses percentuais negativos dados de 2011 revelam que Pernambuco ocupa em termos percentuais de primeiro lugar no ranking de Jovem infrator, ficando na frente de São Paulo que tem quatro vezes mais da população jovem e de Minas Gerais que tem o dobro da população de jovens que tem Pernambuco. Ou seja, São Paulo possui uma população de jovens entre 12 a 18 anos de 6,6 milhões e 6.506 jovens infratores; Minas Gerais detém uma população de jovens de 3,2 milhões e de 1.172 jovens infratores, já Pernambuco tem 1.6 milhões de jovens nessa faixa de idade, sendo 1.647 jovens infratores.
“No ano de 2009 foi lançado pela Secretaria de Direitos Humanos, o UNICEF, o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LAV-Uerj) o Índice de Homicídios na Adolescência (IHA) que tem a prerrogativa de estimar o risco que adolescentes, com idade entre 12 e 18 anos, têm de perder a vida por causa da violência. Além disso, o estudo também avalia fatores que podem ampliar esse risco, como raça e gênero, além da idade e meio (arma de fogo). A expectativa é de que o IHA seja um instrumento que contribua para monitorar esse fenômeno e, também, para a avaliação de políticas públicas, tanto locais quanto estaduais e federais.
“O IHA expressa, para um universo de mil pessoas, o número de adolescentes que, tendo chegado à idade de 12 anos, não alcançará os 19 anos, porque será vítima de homicídio. Por outro lado, estima o número de homicídios que se pode esperar ao longo de sete anos (entre os 12 e os 18 anos) se as condições não mudarem. Hoje, os homicídios representam 45% das causas de morte dos cidadãos brasileiros dessa faixa etária. A maioria dos homicídios – seis, em cada sete – é cometida com arma de fogo. A probabilidade de ser vítima de homicídio é 12 vezes superior para os adolescentes (sexo masculino), em comparação com as adolescentes (sexo feminino), e quase quatro vezes mais alta para os negros em comparação com os brancos”.
Abaixo transcrevemos a tabela que ilustra muito bem a situação:
Tabela 1. Municípios ordenados de acordo com IHA 2007
20 municípios com mais de 200.000 habitantes
com maiores valores no IHA
Município
Estado
IHA (2007)
Ordem
Número de mortes esperadas por homicídio
Foz do Iguaçu
PR
11,8
1º
526
Cariacica
ES
8,2
2º
373
Olinda
PE
8,0
3º
376
Recife
PE
7,3
4º
1351
Maceió
AL
7,1
5º
884
Itaboraí
RJ
6,4
6º
170
Vila Velha
ES
6,3
7º
297
São Gonçalo
RJ
6,2
8º
656
Serra
ES
6,0
9º
306
Duque de Caxias
RJ
5,9
10º
610
Paulista
PE
5,8
11º
215
Arapiraca
AL
5,7
12º
161
Ribeirão das Neves
MG
5,6
13º
245
Vitória
ES
5,6
14º
195
Belo Horizonte
MG
5,6
15º
1472
Betim
MG
5,4
16º
301
Itabuna
BA
5,3
17º
136
Jaboatão dos Guararapes
PE
5,3
18º
457
Contagem
MG
5,3
19º
391
Imperatriz
MA
5,2
20º
170
A tabela acima revela uma situação nada confortável para o estado de Pernambuco, pois se observarmos bem, ele aparece nada mais nada menos que quatro vezes na tabela com os municípios de Olinda, Recife, Paulista e Jaboatão dos Guararapes dentre os vinte com maiores IHA do país. O que caracteriza a região metropolitana onde se mata mais jovens no Brasil.
É possível concluir que os vultosos investimentos feitos no estado e o crescente ao aumento do Produto Interno Bruto – PIB, não estão revertendo de forma favorável à população mais jovem do nosso estado corroborando também o fraco desempenho escolar, fruto de políticas de ensino equivocadas.
Sem deixa de cumprir o seu papel, a escola, por ser instituição que ocupa lugar privilegiado na rede de atenção à criança e ao adolescente, deve assumir papel de protagonista na prevenção da violência contra crianças e adolescentes. O primeiro passo é fornecer subsídios para ajudar a escola a informar a comunidade escolar sobre a realidade da violência contra crianças e adolescentes. Os números falam melhor que qualquer discurso: os jovens em Pernambuco estão sem opções, as escolas e sua educação não mostra perspectivas de um futuro promissor, levando uma geração a buscar nas drogas e no crime o que a escola e a família lhes deveriam proporcionar.
Referências:
Azevedo, M. A. & Guerra, V. N. A. Violência de pais contra filhos: A tragédia revisitada. São Paulo: Cortez, 1998.
Estatuto da Criança e Adolescente – lei 8069/13/07/1990.
Ministério Público do RS – Conselhos Tutelares: Alguns Aspectos (ainda) Controvertidos.
Guia Escolar. Secretaria dos Direitos Humanos e Ministério da Educação – 2004.
Guia Municipal de Prevenção da Violência Letal contra Adolescentes e Jovens. Secretaria dos Direitos Humanos – UNICEF.
Programa Prefeito Amigo da Criança, Conselho Tutelar – Guia para Ação Passo a Passo. Fundação Abrinq.
Relatório Progresso para a Criança. Fundo das Nações Unidas para a Criança – UNICEF, 2012.
Edeildo de Araujo
Diretor de Formação do SINTEPE e Formador da CUT.