[AVISO DE GATILHO: FRASES MISÓGINAS ABAIXO]
“Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade”
“Ela não merece (ser estuprada) porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar porque não merece.”
“Todo mundo ia atrás de galinha no galinheiro na minha cidade. Alguns mais malandros, iam atrás da bezerrinha, da jumentinha. Era comum. Não tinha mulher como tem hoje.”
Quantas frases como essas ou similares nós mulheres escutamos todos os dias? Que mulher nunca ouviu ou presenciou discursos machistas como esses? Muitos proferidos por nossos companheiros, colegas de trabalho, de escola ou de faculdade, em rodas de “conversa” na presença de outros homens que, na sua maioria, aprovam rindo ou silenciando se omitindo de fazer o confronto contra os discursos ou atitudes machistas.
As frases acima foram ditas por Bolsonaro e presenciamos sempre estarrecidas seus apoiadores rirem quando ele pronuncia essas violências. Seus discursos machistas já eram promovidos antes de sua posse, como o perfil agressivo, racista e LgbtqIA+fóbico. Desejou a morte da primeira presidenta Dilma Roussef e homenageou seu torturador; agrediu constantemente a deputada Maria do Rosário (PT-RS); e assumiu uma “fraquejada” ao se referir à sua própria filha.
Todas essas falas ressoam na sociedade brasileira, pois estruturalmente o patriarcado existe e resiste há séculos e se fortalece todos os dias com o capitalismo e o racismo e juntos formam a máquina de moer mulheres. O patriarcado é uma instituição, uma estrutura que permite aos homens terem poderes na sociedade e, a partir dele, cometerem todos os tipos de violências contra nós mulheres.
Uma importante aliada para nós mulheres enfrentarmos o machismo e o racismo que se fortalecem com o capitalismo é a Lei Maria da Penha, nº 9.099/2006, sancionada em 7 de agosto de 2006 é uma das três leis mais avançadas do mundo, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). A Lei prevê medidas protetivas de urgência para as vítimas, cria os seguintes equipamentos para que seja efetiva: Delegacias Especializadas de Atendimento à mulher, Casas-abrigo, Centros de Referência da Mulher e Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher, entre outros. A Lei Maria da Penha estabelece a definição do que é a violência doméstica e familiar, e caracteriza as suas formas: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. O avanço dessa lei é que além de proteger a nós mulheres, “salva nossas vidas, pune os agressores, fortalece a autonomia das mulheres, educa a sociedade e cria meios de assistência e atendimento humanizado, bem como inclui valores de direitos humanos nas políticas públicas para o enfrentamento e combate à violência de gênero.” (Lei Maria da Penha na íntegra e comentada. p. 5)
A Pesquisa DataSenado de dezembro de 2019 realizou um estudo intitulado Violência Doméstica e Familiar contra a mulher que corrobora com a importância da Lei Maria da Penha. Foram ouvidas 2.400 mulheres de todas as unidades da Federação por meio de ligação, 60% dessas mulheres informaram que conhecem alguma mulher que sofreu violência doméstica ou familiar e que 82% dessas agredidas sofreram violência física. Quando perguntadas se sofreram alguma violência doméstica ou familiar provocada por um homem, 73% delas responderam que sim e dessas 66% sofreram violência física e 52% psicológica. O agressor em 41% dos casos foram maridos, companheiros ou namorados e 37% ex-marido, ex-companheiro e ex-namorado.
Mais duas leis importantes para enfrentar a violência contra nós mulheres são a Lei do Feminicídio, nº 13.104 – 9 de março de 2015, e a Lei contra a violência política de gênero, nº 14.192 – 4 de agosto de 2021. Esta, no seu artigo 3º define: “Considera-se violência política contra a mulher toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher”, posteriormente no parágrafo único: “Constituem igualmente atos de violência política contra a mulher qualquer distinção, exclusão ou restrição no reconhecimento, gozo ou exercício de seus direitos e de suas liberdades políticas fundamentais, em virtude do sexo.” Assim, entende-se “política” como definição de qualquer espaço político que nós mulheres ocupamos, para além do partidário: sindicatos, movimentos sociais mistos, associações, coletivos, etc.
Já a Lei do Feminicídio é uma resposta penal contra um crime que vem tirando a vida de milhares de mulheres, vidas assassinadas pelo fato de serem mulheres. O Mapa da Violência contra a mulher de 2018 aponta dados assustadores: “Cerca de 6,7% das vítimas de feminicídio possuíam menos de 18 anos de idade. A maioria (90,8%) das mulheres assassinadas nesta condição tinham entre 18 e 59 anos de idade.” Se fizermos um recorte de raça, identificamos as maiores vítimas do feminicídio no Brasil: 66,6% das mulheres negras sofreram feminicídio, contra 33,1% de mulheres brancas, segundo o Dossiê Mulheres Negras e Justiça Reprodutiva (2020-2021).
O autor do feminicídio são seus “companheiros, ex-companheiros, namorados e esposos. Eles representam 95,2% dos algozes. Já os parentes, em especial os pais, avós, irmãos e tios representam cerca de 4,8% dos responsáveis pelo feminicídio.”
Desde o dia 20 de novembro, iniciou os 21 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres, a data de luta foi estabelecida no Primeiro Encontro Feminista Latino-Americano e do Caribe realizado em Bogotá, Colômbia, em 1981, foi uma homenagem às irmãs Mirabal ou Las Mariposas: Patria, Minerva e Maria Teresa. Elas foram brutalmente assassinadas pelo ditador Trujillo em 25 de novembro de 1960 na República Dominicana. O fato ocorreu quando elas regressavam de Puerto Plata, onde seus maridos estavam detidos. Elas foram abordadas na estrada e assassinadas por agentes do governo militar, os quais simularam um acidente.
Vivenciamos, na atual situação social e política do Brasil, uma série de ataques contra nós mulheres fruto do ódio fomentado pelos discursos bolsonaristas, os quais são recebidos na sociedade machista, racista e LbtqIA+fóbica. Um recorte do discurso misógino apresentado no início deste texto, que é referendado pela sociedade, não ficaram impunes, a procuradora Lisiane Braecher e o procurador Pedro Antonio de Oliveira Machado foram autores de um processo por danos morais contra a União, neste processo estão incluídos: Damares Alves, ministra da pasta Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; o ministro da economia Paulo Guedes; o ex-titular da pasta da Justiça Sérgio Moro e o ministro das Relações Internacionais Ernesto Araújo.
Nossos corpos nunca estiveram tão vulneráveis às violências machistas, principalmente na pandemia de Covid 19, na qual Bolsonaro negou ações de assistência como acesso a métodos contraceptivos e a realização de abortos em casos previstos na legislação: “No que depender de mim, não terá aborto.” Além desse fato, Bolsonaro negou a distribuição gratuita de absorventes para estudantes de baixa renda de escolas públicas e para pessoas em situação de rua ou de extrema vulnerabilidade.
Portanto, o dia 25 de novembro é uma data para demarcar que nós mulheres resistiremos e não aceitamos qualquer discurso ou atitude machista e que uma sociedade só será justa, igualitária e democrática sem o patriarcado, o capitalismo, o racismo e a LgbtqIA+fobia tarefa revolucionária de todas, todos e todes.
“Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres!”
REFERÊNCIAS
A LEI NA ÍNTEGRA E COMENTADA. Instituto Maria da Penha. Disponível em: https://www.institutomariadapenha.org.br/lei-11340/lei-maria-da-penha-na-integra-e-comentada.html. Acesso em: 24 de novembro de 2021.
CRIOLA LANÇA DOSSIÊ COM RETRATO DE VIOLAÇÕES DE DIREITOS DAS MULHERES NEGRAS E IMPACTOS NA SAÚDE REPRODUTIVA. Criola. Disponível em:<https://criola.org.br/criola-lanca-dossie-mulheres-negras-e-justica-reprodutiva-nesta-sexta-feira-01-10-as-19h/> . Acesso em: 24 de novembro de 2021.
MAPA DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER 2018. Câmara. Disponível em: < https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/comissao-de-defesa-dos-direitos-da-mulher-cmulher/arquivos-de-audio-e-video/MapadaViolenciaatualizado200219.pdf
VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: AGRESSÕES COMETIDAS POR ‘EX’ AUMENTAM QUASE 3 VEZES EM 8 ANOS. Senado, 2019. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/institucional/datasenado/publicacaodatasenado?id=violencia-contra-a-mulher-agressoes-cometidas-por-2018ex2019-aumentam-quase-3-vezes-em-8-anos-1. Acesso em: 24 de novembro de 2021.