Bônus desqualificante
Agora, desde que tenham responsabilidade, esses gestores terão de promover o diálogo com quem de fato faz a educação acontecer a fim de construir políticas que contemplem, efetivamente, a valorização profissional dos educadores e a elevação da qualidade do ensino público no nível básico.
O recente cancelamento dos bônus concedidos aos professores da rede pública de educação básica de Nova York (EUA) pegou de surpresa parte dos gestores brasileiros, acostumada a copiar ideias simplistas e empregá-las em diversos (e controversos) contextos nacionais.
Agora, desde que tenham responsabilidade, esses gestores terão de promover o diálogo com quem de fato faz a educação acontecer a fim de construir políticas que contemplem, efetivamente, a valorização profissional dos educadores e a elevação da qualidade do ensino público no nível básico.
Em primeiro lugar, é preciso mudar a concepção equivocada daqueles que insistem em acusar os profissionais da educação e os sindicatos de só pensarem em seus interesses individuais, a exemplo do que alardeia Gustavo Ioschpe (colunista de Veja e consultor da Rede Globo).
Trata-se de uma visão preconceituosa, esquiva e entranhada de paradoxos, pois além de desconsiderar as reais e precárias condições de vida e de trabalho da maioria dos/as educadores/as, também não explica (tampouco justifica!) o comprometimento da categoria com a causa maior de educar e formar melhores cidadãos.
Assim, claro está que, além de profissional, o/a educador/a brasileiro/a tem forte vocação para exercer sua profissão, e não abre mão de ser reconhecido, valorizado e considerado sujeito ativo nas decisões voltadas à sua atuação profissional.
Para a CNTE, o centro do debate sobre qualidade da educação consiste em instituir um Sistema Nacional de Educação (SNE) pautado na democratização da gestão educacional, uma vez que a escola é pública e não estatal, cabendo, portanto, à sociedade geri-la em parceria com o Estado.
Outras duas políticas essenciais, a serem coordenadas pelo SNE, referem-se à (i) valorização profissional – que implica a oferta pública, gratuita e de qualidade de formação inicial e continuada aos educadores, salários dignos e carreiras profissionais atraentes, além de jornadas e de condições de trabalho compatíveis para o êxito escolar; e (ii) financiamento público capaz de garantir a oferta de educação com qualidade e equidade no país.
Sobre o aspecto da avaliação, imprescindível para aferir o nível de qualidade nos sistemas de ensino, além de considerar os impactos das políticas acima elencadas, ela (avaliação) também precisa levar em consideração – do ponto de vista estrutural – os aspectos sociais da comunidade e de organização das redes/sistemas e das escolas, tais como a renda per capita e o nível de formação das famílias usuárias da escola pública; a infraestrutura e o projeto pedagógico escolar; os critérios de participação e a inserção efetiva da comunidade nas decisões da escola; a relação professor/aluno no sistema de ensino e nas salas de aula, dentre outras.
Sob a ótica da concepção pedagógica, a avaliação necessita incorporar os múltiplos aprendizados escolares, que estão longe de serem captados apenas nos testes nacionalizados. Isso requer valorizar e incentivar as produções acadêmica, artística e cultural, assim como a inserção da escola na comunidade e a nota que estudantes, pais e educadores dão ao espaço em que convivem, transmitem, produzem e acumulam conhecimento.
Tal como a política de bônus – que reduz o conceito de qualidade ao treinamento dos estudantes para responderem a testes restritos – o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) também apresenta limitações estruturais, embora capte os maléficos efeitos da reprovação e da evasão escolares.
A proposta de PNE, em trâmite no Congresso Nacional, abre a possibilidade de aprimoramento do Ideb, o qual, futuramente e desde que absorvidas as propostas da sociedade, poderá também constituir-se numa ferramenta voltada para a valorização da carreira dos profissionais da educação.
Embora o fracasso dos testes no país que serviu de referência para o mundo, seja fato concreto, a mídia brasileira – porta-voz de partidos políticos conservadores e dos detentores do capital – tenta ludibriar a opinião pública e impor à sociedade suas teses (fracassadas) de qualidade educacional pautada nas avaliações restritivas e na política de bônus escolares.
É o caso do editorial da Folha de São Paulo, de 25 de julho de 2011 (veja aqui) e da proposta do colunista Gustavo Ioschpe de afixar na porta de cada escola a nota do Ideb.
Diante do ranço midiático, que camufla interesses espúrios, é preciso acirrar a luta do movimento sindical contra os princípios da educação empresarial – herança maldita do neoliberalismo – que insiste em fincar suas garras nos sistemas de ensino do país. O desafio se mantém!
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO (CNTE)